Alguns componentes lingüísticos no ensino da terminologia[1]

Jean-Claude Boulanger (Université Laval)

Introdução

Toda terminologia possui uma finalidade socioprofissional e serve prioritariamente para exprimir saberes temáticos. Como amálgama (ver Sager, 1990), atrela-se a diversos edifícios doutrinários nos quais o componente lingüístico, por si só subdivisível, pode ser isolado para fins de análise. Dando seqüência a esse raciocínio, circunscreve-se a lingüística como um circuito obrigatório na formação e na aquisição de conhecimentos para os futuros terminólogos. Então encontra-se, neste ponto, um primeiro postulado : a terminologia é um campo da lingüística, tanto sob o ponto de vista da teoria, quanto sob o ponto da prática.

Nesse processo da formação de terminólogos, duas orientações maiores são historicamente identificáveis :

  1. uma formação in vitro, ou seja, no meio profissional e sem preliminares universitárias, este caminho normal prevaleceu até a metade dos anos 70, ao mesmo tempo em que a terminologia começou a se organizar coletivamente no mundo ocidental;
  2. uma formação universitária in vitro, integrada aos programas de tradução ou, mais raramente, de lingüística.

A criação dos cursos universitários seguiu paralelamente ao desenvolvimento da terminologia como conjunto multidisciplinar. Na América do Norte, os primeiros cursos estruturados de terminologia foram realizados em 1972, em uma universidade francófona do Québec. Até o início dos anos 80, cursos e programas de primeiro, segundo e terceiro ciclos foram organizados e instaurados na quase totalidade das instituições do auto-saber quebe-quense. Paralelamente, no conjunto do hemisfério Norte - salvo nos Estados Unidos -, tais progressos puderam ser observados e descritos em um bom número de publicações sobre o assunto, sem contar a existência de uma série de encontros científicos que tratavam, no todo ou em parte, do ensino da terminologia (ver bibliografia). Em outros lugares, no hemisfério Sul francófono (África do Norte e África negra), projetou-se seguidamente a instauração de tais cursos, com todas as dificuldades a superar para completar a transferência de especialistas (ver Boulanger, 1986). Entretanto, esta estruturação universitária é muito mais avançada no mundo latino-americano. Somos todos, no momento atual, numerosos países e Estados que põem em prática um ensino coerente e completo da terminologia. Esta formação é de nível superior (universidades e escolas) na sua maior parte. Ela é objeto de um percurso bem balizado para os estudantes e desemboca em diplomas conseqüentes.

Percepções da terminologia

Sob um rótulo ou outro e onde quer que seja no mundo, a terminologia é enxertada em dois grandes conjuntos, assim ramificados :

  1. De início, o eixo propriamente lingüístico que permite perceber a terminologia como componente do campo da lingüística ou como simples satélite da tradução. No primeiro caso, ela é fundamental no processo da formação; no segundo, ela figura como simples complemento na formação de tradutores. No Canadá, as duas opções existem, a escolha mais oportuna fica sob a responsabilidade de cada programa universitário e se faz em conformidade com as necessidades do meio que demanda. Assim, a Universidade de Montréal favorece a dimensão interlínguas, enquanto, na Université Laval, é a dimensão das ciências da linguagem que predomina.
  2. Em segundo lugar, o eixo “aménagemental” que permite situar a terminologia no meio das legislações lingüísticas que a fazem um elemento privilegiado da metamorfose lingüística em um Estado. É, no sentido positivo, a dimensão coercitiva da terminologia, como ela existe no Québec (a Carta da Língua Francesa, que privilegiou a instauração do francês como língua oficial da Província) e no Canadá (a Lei sobre as Línguas Oficiais, advogando em favor da igualdade do inglês e do francês em todas as instituições federais do país). A hipótese de “aménagement” social pode igualmente surgir de ordem incitativa, como é o caso notadamente da França, onde, a despeito das legislações tímidas e dos esforços das comissões ministeriais de terminologia, a tomada de decisões oficiais resta fragmentária e resulta, antes de tudo, da vontade individual. O consenso não parece ter sido alcançado, apesar da difusão recente da disciplina terminológica nas universidades do norte e do nordeste do Hexágono.

Toda formação em terminologia procede, pois, de uma ou de outra dessas ideologias com todos os cruzamentos que se possa imaginar. Embora a opção lingüística emparelhada às preocupações de planificação coercitiva seja mais rara na Europa, a Catalunha é uma exceção.

Acrescente-se a isso que, há algum tempo, é preciso dedicar atenção particular à socioterminologia, que começa a confirmar sua existência (ver Gambier, 1991a), à microinformatização, que revolucionou a pesquisa terminológica e terminográfica e cuja amplitude cresce a cada dia, sem deixar de mencionar o prodigioso desenvolvimento dos instrumentos de tecnologia lingüística que constituem as indústrias da língua, e começam a ampliar as estritas preocupações da terminologia e da terminótica, como se sabe.

Perfil lingüístico

É neste contexto efervescente, no qual a ideologia ocupa um lugar preponderante, que será abordado o perfil lingüístico do terminólogo ideal; será abordado com enfoque dirigido à etapa da formação no primeiro ciclo universitário.

Aqui, uma vez mais, o aspecto pedagógico da terminologia advém de uma nova ideologia, coligada à ciência, e não a diversas implicações políticas. Conseqüentemente a terminologia de-ve integrar, em seu vasto leque mul-tidisciplinar, uma dimensão doutrinária constituída pela lingüística teórica e aplicada reconduzida às proporções essenciais pelos lingüistas (ver Boulanger, 1986 : 60). Parece uma aberração desenvolver um trabalho de pesquisa estruturado sobre as Línguas de Especialidade (LSP), sem apoiar-se nos princípios e nas metodologias fundadas em um plano de fundamentação lingüística. Como sistematizar os mecanismos de decisão de outra forma?

A terminologia é tão tributária da lingüística, que, fora da lingüística, não há salvação para o terminólogo, ainda que seja preciso atribuir a esta afirmação seu justo valor. Não se deve acreditar que todos os terminólogos devessem se transformar em um Chomsky do termo. Esse certamente não é o objetivo prioritário da formação. Antes de mais nada, trata-se de preparar práticos, especialistas para trabalhar em situações de comunicação especializada bastante concretas. Não se pode ter um bom terminólogo, sem que ele conheça alguns preceitos lingüísticos, sem possuir uma formação de base estruturada em torno de alguns componentes de ciências da linguagem em vista de poder administrar um certo número de mecanismos fundamentais da terminologia e de reempregá-los nas situações necessárias. Daí a hipótese de que o passo formativo característico consiste em começar o ensino a partir da lingüística teórica, antes de se voltar para os aspectos metodológicos da terminologia e da terminografia e, depois, para a prática.

Com o objetivo de detalhar e de explicitar o segundo postulado deste estudo, convém pôr a questão de saber por qual lingüística deve passar a formação de terminólogos. Para os terminólogos da tradução e da simples transferência interlingüística de termos, orbitar em torno de algumas nuanças sobre o léxico e aterrissar em gramática parece satisfatório. Este, porém, não é o ponto de vista defendido neste estudo. Motivo : a) todo mundo afirma que a terminologia se ocupa de conceitos, de termos e de denominações antes de qualquer coisa, resultando daí sua sistematização nos repertórios temáticos; b) os conceitos se orquestram de maneira a nunca aparecerem isolados dos conjuntos onomasiológicos nos quais eles estão inseridos e dos quais eles dependem. Nenhum programa de ensino da terminologia, portanto, pode permitir negligenciar esta problemática fundamental.

A seqüência termo à denominação + conceito é nada mais que outra fórmula saussureana do signo metamorfoseado de seu enunciado clássico signo à significante + significado em um novo e mesmo esquema básico percebido metaterminologicamente. Em sua essência, a equação do mestre genebrino, que está na origem de toda a lingüística do século XX, resta imutável. Ela foi simplesmente adaptada à ecologia das LSP.

LG : signo → significante + significado

LSP : termo → denominação + conceito

Esta equação domina, pois, o conjunto da pesquisa em terminologia. Assim, parece impossível escapar do domínio da lingüística na formação de terminólogos. Contudo, sustenta-se um terceiro postulado demonstrativo de que a terminologia é um componente essencial da lingüística por natureza. Em razão de suas próprias características, ela pode também reivindicar sua autonomia no vasto corpus doutrinário das ciências da linguagem, o que certos lingüistas contestam. Qualquer que seja o programa universitário, a primeira etapa a transpor no processo de formação de terminólogos será, inevitavelmente, a aquisição de conhecimentos lingüísticos mínimos, orientados em direção ao signo. Todas as outras qualidades exigidas dos candidatos girarão em torno desse ponto, porque, sem termos, não existe terminologia.

O futuro praticante que não possui nenhum saber lingüístico prévio seguirá um caminho bem restrito. De início, terá de adquirir conhecimentos sobre o funcionamento da língua em geral, para progredir, em seguida, nos segredos do funcionamento das LSP. É impossível desligar os subcódigos tecnoletais do conjunto da língua. Na sua totalidade, trata-se de um sistema de sistemas de signos associados e utilizados por diversos grupos sociais pertencentes a uma mesma comunidade lingüística.

A gradação no interior da lingüística é, pois, orientada pela equação já citada anteriormente, o que significa repetir que, para utilizar estes aspectos, é preciso também apresentar o quadro geral da situação da terminologia no seio da lingüística sincrônica contemporânea. Depois, é preciso fazer saber ao estudante que a terminologia consiste, no plano lingüístico, em procurar os termos funcionais e organizados em um domínio, em criar termos novos no caso de carências, em empregar estes termos nos discursos temáticos idôneos, quer dizer, em implantá-los no uso.

Sobre o plano lingüístico, somente as duas primeiras partes nos reterão, a última pertence principalmente à socioterminologia e à fraseologia, assim como à sintaxe. Os componentes que aqui serão examinados dizem respeito, antes de tudo, ao signo, ou melhor, à unidade lexical terminológica. Esta abordagem de todos os aspectos do signo traça o caminho da formação lingüística fundamental.

Uma escolha de componentes lingüísticos

Trabalhar em terminologia supõe notadamente fazer apelo aos conhecimentos sobre o léxico, sobre a semântica, sobre a morfologia, sobre a lexicografia. Informação sobre fonética ou fonologia, sobre etimologia, sobre gramática e sintaxe são também muito úteis. Contudo, os quatro fatores enunciados inicialmente neste parágrafo serão objeto de reflexão, por sua natureza universal.

Léxico

Sob a aparência de entidade lexical, o termo se alia certamente à parte mais visível da terminologia do ponto de vista lingüístico. Também parece primordial que se precise ao estudante o que é a palavra - talvez seja mais fácil ensinar-lhe o que não é! Esta visão geral da palavra deve evocar pouco a pouco o termo e situá-lo como unidade fundamental das LSP. É por meio dela que o conceito se revela no discurso e nos dicionários. Como fazer terminologia sem manipular as características do termo em relação às unidades da língua geral e em relação às suas próprias congêneres em LSP? O termo complexo ou sintagma que, em francês, participa de mais ou menos 80 % das nomenclaturas especiali-zadas deve ser objeto de um exame extremamente cuidadoso. É imperativo examinar sob todos os pontos e estabelecer uma tipologia. O capítulo introdutório sobre as unidades constitutivas da língua deve ter como centro a palavra e o termo.

Por outro lado, em uma situação como a do francês quebequense, é evidente que a variação lexical deve ser levada em consideração de modo sério e profundo. O terminólogo deve estar apto a fazer um julgamento claro sobre o léxico e a norma privilegiados em cada um dos contextos geográficos de uma mesma comunidade de locutores, no caso do Québec e da França. Um listage (Q) não é um listing (F), um traversier (Q) não é um ferry (F), um chiropraticien (Q) não é um chiropracteur (F), o soccer (Q) não é o football (F), o hockey sur glace (F) é tão-somente uma expressão pleo- nástica em Québec onde apenas hockey ocupa o campo conceptual, pois o hockey sur gazon é ali desconhecido etc.

Semântica

Ao abordar o aspecto semântico, o terminólogo atinge diretamente o significado dos termos, quer dizer, a noção, o conceito, assim como o vasto problema da hierarquização das unidades mentais, a estruturação do léxico e as interferências lexicais : sinonímia, homonímia, polissemia, analogia etc.

A semântica se abre sobre dois elementos entre os mais cruciais da terminologia, a saber, a redação das definições - por meio do recorte conceptual e das classificações hierarquizadas - e os aspectos normativos ou a escolha de uma maneira de dizer selecionada prioritariamente em relação a outras possíveis, emprestadas, dispersas, ou até mesmo inexistentes, sobre uma graduação socioprofissional ou sobre várias. Ideal e teoricamente, deseja-se que, em terminologia, a um só conceito corresponda uma só denominação. O que leva a tentar reduzir, senão a anular, a sinonímia, recorrendo a uma forma de dirigismo e de reducionismo lexical sob a aparência da normalização. Deseja-se também que a uma só idéia corresponda uma só designação. Isto conduz a rearranjar um pouco artificialmente a polissemia intersetorial, advogando em favor da hominímia em LSP. Para dar dois exemplos concretos, os termos opération e signe desdobram cada um uma série de etiquetas bem especializadas nos dicionários gerais : opération aparece vinculada à teologia, às matemáticas, à cirurgia, às forças armadas, aos negócios (comércio, bolsa); signo aparece catalogado na medicina , na lingüística, na música, na pontuação, na astrologia, sem que esta enumeração seja exaustiva tanto para uma quanto para outra palavra.

É por meio da análise das fronteiras de domínios que o terminólogo consegue harmonizar um “signo” terminológico, isto é, interditar o acesso a sentidos não-pertinentes em um dicionário cuja pesquisa esteja em curso. Esta é uma atitude de ordem onomasiológica a qual caracteriza a terminologia / -grafia em comparação ao pressuposto semasiológico da lexicologia / -grafia. Hoje, no entanto, o problema da identificação dos domínios puros se confunde com os superdomínios de fronteiras fluidas e permeáveis, como da inteligência artificial, da biotecnologia. Os diferentes sistemas de signos especializados se entrecruzam, emprestam-se um a outro quando não se fundem. Certas pesquisas mostram bem que existe dúvida e que o puro compartimento entre os saberes profissionais é uma utopia cuja utilidade é de natureza teórica (ver Gambier, 1991b). O jogo do real oferece um quadro bem diferente.

Morfologia

A morfologia recobre especialmente o vasto campo da formação das palavras. Ela fornece ao estudante o arsenal dos mecanismos de regulação e de renovação do léxico. O conhecimento dos elementos morfológicos e das características formais para diferentes esferas da atividade permite resolver grande número de problemas que se apresentam na prática. É, portanto, importante compreender que, nas mais variadas disciplinas científicas (medicina, biologia etc.), recorre-se mais facilmente à formação científica greco-latina, ao passo que, na técnica, privilegia-se, sobretudo, a formação a partir de morfemas franceses, assim como, em todos os casos, a formação de unidades complexas diferencia as LSP da língua geral. Por exemplo, a medicina emprega um contigente de afixos e de elementos morfológicos greco-latinos, aos quais se adiciona o empréstimo freqüente de nomes próprios (antropônimos e topônimos) a fim de formar termos complexos, por exemplo, “trisomie 21”ou “syndrome de Down”; enquanto o vocabulário da informática é quase inteiramente formado pelo acoplamento de elementos da língua geral ascendendo ao estatuto de termo, por sua associação em complexos sintagmáticos mais ou menos longos aos quais se enxertam significações metafóricas (ex. mémoire vive, disque rigide, courrier électronique). Neste nível, intervêm os conhecimentos morfossintáticos na organização dos esquemas sintagmáticos, notadamente no que diz respeito aos papéis de diferentes tipos de juntores (preposições, determinantes etc.) que associam os elementos lexicais entre si.

Do ponto de vista da criação lexical, a morfologia é o mais importante elemento a controlar. Por comodidade, incluir-se-á na neologia, tudo o que se refere à formação de palavras novas, ao empréstimo, ao decalque (ver Boulanger, 1991), do qual nenhum terminólogo escapa, sob a influência da modernidade, de uma parte, e do fenômeno da variação lingüística, de outra. As terminologias novas podem, pois, ser objeto de um consenso, de uma divisão dentro de um grupo de noções que utilizam a mesma língua , por exemplo, a francofonia, a hispanofonia, a anglofonia... Simultaneamente, cada território pode reinvidicar as necessidades lexicais que correspondem às especificidades sociais. Um exemplo preciso da fusão das preocupações no Québec é o problema da feminização dos nomes de ofícios, de profissões, de funções, de títulos etc., praticamente ignorado na França, em razão de uma pressão social menos forte. No Québec, a feminização é contínua e socialmente organizada, há dez anos (ver OLF, 1990). Para os quebequenses, madame Thatcher, enquanto esteve na função, era designada la premièra ministre de Grande-Bretagne, da mesma forma como madame Cresson, quando de sua rápida passagem no comando do governo francês, não podia ter outro título que o de première ministre de France. Qualquer outra denominação seria lingüisticamente inaceitável, ao menos para os falantes quebequenses.

A criação de oficialismos, - de termos normalizados ou recomendados pelas comissões de terminologia, - faz parte também das preocupações morfológicas, associado-se ao vasto campo da normalização. O critério da harmonização e da correção lingüísticas desenvolvem igualmente um papel relevante, já que é preciso saber criar palavras e termos para intervir com eficácia na língua e padronizar corretamente. É no nível morfológico que se detectam as primeiras marcas da funcionalidade de um vocábulo novo que se deseja inserir no uso. Os outros parâmetros relativos à motivação dos termos lhe são subordinados.

Lexicografia

O terminólogo deve organizar a lexicografia segundo dois pontos de vista antagonistas e complementares que são os de decodificador e os de codificador.

Lexicografia de decodificação

No decorrer de todas as etapas do trabalho de pesquisa terminológica, os terminólogos utilizam e consultam constantemente vários tipos de dicionários e de enciclopédias, no centro dos quais se encontram os dicionários gerais e os dicionários terminológicos. O conhecimento de seus mecanismos de elaboração e de funcionamento revela-se um trunfo capital. Acontece que não se decodifica um dicionário de língua sem uma aprendizagem preliminar.

Se for tomado como exemplo um dicionário de língua qualquer para adultos, constata-se que cada artigo revela intrinsecamente, por meio das rubricas microestruturais, todos os componentes da lingüística que são essenciais à análise, a fim de que se tire o melhor partido possível. Constatar- se-á, bem rapidamente, que cada rubrica denuncia uma soma de conhecimentos específicos.

Apresentada meio desordenadamente, estas são algumas das grandes orientações do perfeito microcosmo da lingüística que desenha um artigo de dicionário. Para quem sabe ver o essencial ele aqui está, e o essencial pode-se ensinar. A aprendizagem da decodificação de um dicionário de língua é a melhor preparação que existe para a codificação dos termos nos repertórios terminológicos. Além disso, o que acaba de ser dito convém também aos dicionários de termos, pelo menos no que concerne às rubricas comuns.

Lexicografia / a terminografia de codificação

O terminólogo é levado a construir dicionários tecnoletais seguindo uma série de operações de natureza onomasiológica, o que os distingue fundamentalmente de seus congêneres em língua geral construídos principalmente segundo uma perspectiva semasiológica. Daí a necessidade de ensinar bem as diferentes fases de elaboração de um dicionário terminológico e de lhes precisar as diferentes rubricas. Mas é passando pelos meandros da língua geral que o especialista penetra no coração dos domínios temáticos.

O dicionário constitui, de fato, o resumo e o amálgama de todos os conhecimentos adquiridos sobre o léxico, a semântica e a morfologia, bem como sobre a morfossintaxe. Por meio de uma obra lexicográfica ou terminográfica, pode-se verdadeiramente medir o progresso e os conhecimentos lingüísticos adquiridos pelos estudantes, assim como sua capacidade ao reemprego.

Conclusão

A terminologia está situada na junção de diversas disciplinas das ciências da linguagem, particularmente naquelas que foram comentadas anteriormente. Com a apresentação de cada uma separadamente, conclui-se que elas formam um conjunto indivisível, que neste estudo foram fracionadas para fins de demonstração. Toda palavra, todo termo é, por sua vez, colorido pelo léxico, pela semântica, pela morfologia e, por isso, ele é passível de ser lexicografado, terminografado.

O percurso a ser seguido, por meio destes quatro grandes campos da lingüística teórica, conduz à finalidade prática das áreas lingüísticas ministradas em um curso de terminologia. O que é transmitido ao estudante deve estar assentado em uma praxis totalmente voltada para o uso socioprofissional potencial. O aqui perfil traçado parece ser de ordem sincrônica. Isso não importa, porque não se admite uma terminologia que não leve em conta as dimensões históricas e diacrônicas da língua sobre a qual se trabalhe. A terminologia contemporânea não surge do vazio. Suas bases são estruturadas pela história : a história de cada língua formata e caracteriza seu léxico, sua semântica, sua morfologia, sua lexicografia moderna. Nenhum comportamento língüístico, geral ou profissional, escapa à história, nem à sociedade que construiu a história. Todo ensinamen-to, toda formação universitária em terminologia deve estar geograficamente circunscrita e assentada em planos sociopolítico-culturais de uma comunidade de falantes. Também cada formação, por meio de seu caráter universal, detém alguma coisa de especialmente social e territorial. Toda estratégia pedagógica visa a assegurar o cumprimento, o contínuo e o controle dos programas de organização definidos em outras estratégias provenientes dos contextos político, legislativo, social, educacional etc. Uma formação adequada de futuros linguistas que organizam o léxico e de linguistas-terminólogos é uma condição sine-qua-non ao sucesso dos projetos traçados para uma sociedade.

Resta precisar que, quando o objetivo de uma formação lingüística em terminologia é o de contribuir para o sucesso do empreendimento de organização lingüística de uma comunidade, não é tão simples controlar, ao mesmo tempo, a prática profissional e o saber-fazer na execução do trabalho. Apesar de perfeitamente ajustadas, estas duas ações se tornam inconsistentes se não houver um sólido conhecimento de uma boa parte das ciências da linguagem. O inverso também é verdadeiro, porque é certo que somente o domínio da lingüística não é suficiente para fazer bons terminólogos. Se um alimentar o outro, encontrar-se-á, na complementaridade, o filão de esperança e de sucesso.

Referências bibliográficas

Notes

[1] Este artigo é uma adaptação para o português de uma comunicação apresentada em junho de 1991, no Colóquio Ibero-americano sobre ensino da terminologia (Granada, Espanha). O texto intitulado Alguns componentes lingüísticos no ensino da terminologia foi publicado nas Atas do Colóquio cuja referência é O ensino da terminologia. Atas do Colóquio Ibero-americano sobre ensino da terminologia, Granada, Escola Universitária de Tradutores e Intérpretes, Universidade de Granada, Espanha, 1992, 303p.

Référence bibliographique

BOULANGER, Jean-Claude (1995). « Alguns componentes lingüísticos no ensino da terminologia », Ciência da Informação, vol 24, no 3, p. 313-318. [article]

Abstract (anglais)

Some linguistic components of instruction in terminology

The training of terminologists requires well defined linguistic orientation. In North America, the first structured courses in terminology were held in 1972 in a French-speaking university of Quebec. Nowadays, however, many countries carry out a coherent and complete teaching of terminology. In any university program, the first obstacle in the training process of terminologists must be the acquisition of minimum linguistic knowledge, directed to the sign. Working with terminology requires knowledge of lexic, semantics, morphology and lexicography. A lexicographical or terminological work enables measuring the progress and the linguistic knowledge acquired by students.

Keywords: Terminology; Linguistics; Training of personnal in terminology.

Resumo (portugais)

A formação de terminólogos exige orientações lingüísticas bem definidas. Na América do Norte, os primeiros cursos estruturados de terminologia foram realizados em 1972, em uma universidade francófona do Québec. Atualmente, porém, numerosos países põem em prática um ensino coerente e completo da terminologia. Qualquer que seja o programa universitário, a primeira etapa a transpor no processo de formação de terminólogos deve ser a aquisição de conhecimentos lingüísticos mínimos, orientados em direção ao signo. Trabalhar em terminologia pressupõe ter conhecimentos de léxico, de semântica, de morfologia, de lexicografia. Uma obra lexicográfica ou terminográfica permite, portanto, que se mensurem o progresso e os conhecimentos lingüísticos adquiridos pelos estudantes.

Palavras-chave: Terminologia; Lingüística; Capacitação de profissionais em terminologia.